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Territorialidades e Continua

Nomadismos, Contatos e Conflitos

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  O vínculo entre a(s) identidade(s) e a(s) cultura(s) pode e deve ser examinado na perspectiva do contato e do conflito linguístico. Os mitos da formação de uma cultura procedem em grande parte de preconceitos que dizem respeito, dentre outras coisas, ao que se costuma chamar de invenção da escrita. O que veio antes, a fala ou a escrita, o gesto ou a fala? Como se deu a relação entre transmissão de mitos, escrita e religião? Qual foi e qual é a função da cultura ou da identidade na formação das línguas ao longo da História? A função da escrita seria de comunicar, perenizar, elitizar ou democratizar? Tentaremos mostrar a complexidade e os paradoxos que regem as relações nada evidentes entre esses conceitos. Enfim, veremos que é provável que estejamos assistindo nos dias de hoje a uma nova revolução que transforma radicalmente o lugar da língua, da cultura, da identidade e da escrita nas sociedades – revolução geralmente associada à globalização e à internet.

  De princípio, existe uma situação conflituosa resultando das funções antagônicas da língua dita oral – processo em constante mudança – e da escrita – que, fixada em papel ou em outro suporte, visa a perenização, ou seja, o imobilismo.

  Ao examinarmos as origens e as transformações das línguas e das escritas, assim como as diversas hipóteses com as quais preenchemos as nossas ignorâncias, só podemos verificar que as transformações ou mudanças que afetam as línguas e as escritas que lhes são associadas caminham por itinerários diferentes, com ritmos diferentes, e condicionadas por fatores divergentes, sejam eles culturais ou identitários, resultantes de contatos e/ou conflitos.

  As línguas também ora se movem, se deslocam, ora fincam pé, dando então argumento a quem as defende como patrimônio conservador, ameaçado por “bárbaros”; da mesma forma, os povos podem mudar de território, levando ou não as suas línguas na bagagem...

  Outro ponto de conflito é a própria definição daquilo que é uma língua, em oposição, por exemplo, a uma variedade, um dialeto, um socioleto ou um registro, que está longe de ser um ponto pacífico. Geralmente, recorre-se à escrita para caracterizar uma língua, em oposição a outros “falares” de menos prestígio. Como se pode sustentar tal uso da escrita, já que parece ser demonstrado que uma língua e a escrita da quais se faz uso em determinada sociedade são na verdade processos e objetos diferentes?

  A metáfora que transforma as línguas em seres vivos, com árvores genealógicas, línguas mãe e irmãs, de contato ou de casamento, se encaixa claramente numa descrição explicativa que data do triunfo do positivismo no século XIX. Só que as línguas não são objetos, ainda menos seres vivos, mas são processos. Ao contrário da escrita, que pode ser tanto um objeto material, como uma técnica.

  Resta tirar partido do rico acervo que está a nossa disposição, em particular do acúmulo de documentos constituído ao longo dos séculos em determinadas regiões paradigmáticas, como o mar Mediterrâneo, ou a América Latina. Tais documentos nem sempre foram aproveitados na perspectiva globalizante, interdisciplinar e ecológico que estamos propondo aqui.

  Mais particularmente, nossa proposta seria um questionamento e um reexame critico de categorias tidas até agora como noções consensuais, no que diz respeito sobretudo a: contato e conflito linguístico, língua oral versus língua escrita, norma versus variedade, tipologia das escritas e família de línguas. Para tanto, recorreremos aos dados variados dos quais dispomos atualmente sobre a história das línguas, as diferentes técnicas de escritas tanto ao longo da história como na atualidade, os objetivos – e preconceitos – da dialetologia, os atlas linguísticos, os pressupostos da educação linguística escolar, last but not least, as mudanças nos tempos de hoje, com os nem tão novos meios de comunicação e de armazenamento.

 Enfim, ao relacionar conjuntos linguísticos com esferas religiosas, poderemos denunciar de que forma houve instrumentalização dos produtos culturais, sejam eles línguas, mitos ou religião, com a intenção de fragmentar as comunidades humanas e de construir e manter poderes que se apropriam legitimidades contestáveis. Esta consideração permite inserir as pesquisas na área das ciências humanas num projeto que seja verdadeiramente de grande importância para o futuro imediato das nossas sociedades modernas.

  Sendo assim, o PPGLEN e, especialmente, o NELCC tem o prazer de convidar todos os interessados a participarem do SELCC-UFRJ, que será realizado de 03 a 05 de Maio de 2017 na UFRJ.

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